sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Reflexões sobre a modernidade

Ouço esse questionamento diversas vezes durante a semana:
- Dr., por que isso acontece com meu ombro? Sempre escuto outras pessoas também falando que tiveram bursite, tendinite etc.
- Sr., como outras partes do corpo, os componentes do ombro sofrem desgastes naturais do tempo. Não somos eternos. Além disso, é uma articulação muito utilizada durante nossa vida e pouco adaptada para as demandas que existem em nosso cotidiano. Os nossos ancestrais pré-históricos viviam em árvores e possuíam uma estrutura de membros superiores proporcionalmente mais forte e adaptada a vida fora da terra. Os macacos de nosso tempo também funcionam dessa maneira. A partir do momento que nosso meio de locomoção principal passou a ser o caminhar e correr, essa articulação tornou-se menos necessária e estruturalmente menos forte. Acredito que a modernidade, nosso modo de vida, trouxe demandas que não existiam e que nos colocam em rota de colisão como nossa anatomia.
Durante uma conversa com minha esposa no dia de hoje, ela me lembrou de um comentário que fiz há algum tempo. Discutíamos o uso indiscrinado de ritalina e as causas que levaram a essa situação. Uma das coisas que observei é que o encéfalo humano não está preparado para absorver a quantidade de informações que nos chegam. Há um excesso de estimulação visual, auditiva, olfativa etc. Pior, tudo vem pronto e mastigado e não demanda nossa capacidade de reflexão. Análise crítica zero! É o que eu chamo de cultura do Google. A superficialidade e o imediatismo.
Pensando de modo evolutivo, imaginaríamos que a partir de todas essas demandas modernas, o ser humano evoluiria para o desenvolvimento de membro mais fortes e adaptados às tarefas atuais. Do mesmo modo, nosso encéfalo evoluiria para ser capaz de processar, quase como um computador, toda essa avassaladora quantidade de informações. No entanto, essas adaptações evolutivas levam milhões de anos para ocorrer. Ademais, o progresso da ciência, de uma certa maneira, interfere com os mecanismos de seleção natural (não entremos nas questões éticas envolvidas, pois a discussão não iria terminar mais), que faz com que os mais adaptados sobrevivam. Vivemos em uma sociedade que geneticamente ainda é bastante influenciada pelo modo de vida de nossos ancestrais: somos obesos porque era importante acumular reservas num ambiente passado inóspito e de muitas carências; somos suscetíveis a esse bombardeio de informações porque era importante para nossa sobrevivência ser um coletor de informações e nos tornarmos sobreviventes em meio a um grupo competitivo.
O homem moderno encontra-se numa encruzilhada: nossa estrutura mental e física está um passo atrás das demandas que existem hoje. Nos sentimos inadaptados ao padrão de vida de nossa civilização. Aliás, não somente os seres humanos, mas o planeta de uma forma geral. Por outro lado, não vamos regredir nosso processo civilizatório a um estágio anterior para estarmos adaptados novamente. Provavelmente não teremos tempo cronológico suficiente para evoluir e acompanhar o progresso e esse mesmo progresso democratiza o direito a vida, mas elimina a seleção natural. Onde isso vai parar? Diversos tumores, infecções, doenças degenerativas são consequência desse choque civilizatório e achar um ponto de equilíbrio entre progresso e saúde é uma questão que se impõe na criação de nosso filhos.

Roberto

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