segunda-feira, 22 de março de 2010

Royalties do Petróleo II

Fonte: Agência Brasil

A redistribuição para todo o país de royalties provenientes da exploração do petróleo, aprovada pela Câmara, promete ainda muita polêmica. O tributarista Ives Gandra da Silva Martins aposta que, qualquer que seja o caminho adotado para mudar a forma atual de distribuição, a discussão necessariamente vai desaguar no Supremo Tribunal Federal (STF).

Apesar de concordar com a distribuição de royalties para todo o país, Gandra considera que a Emenda Ibsen, como ficou conhecida, que prevê a distribuição dos royalties para todos os estados e municípios brasileiros utilizando o critério do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e do Fundo de Participação dos Estados (FPE), fere a Constituição.

“Pessoalmente, considero a medida justa, mas ela é inconstitucional. Eu tenho a sensação que riquezas nacionais deveriam ser divididas por todo o país. Mas a Constituição declara no Artigo 20, claramente, que a riqueza pertence aos municípios onde as riquezas vão ser exploradas e, por essa razão, só por uma emenda constitucional [PEC] poderia se alterar isso. Da forma como foi colocada, por meio de legislação, não por uma PEC, tenho a impressão que o presidente vai vetar por ser inconstitucional. Fere o Artigo 20 da Constituição”, explicou.

A nova redistribuição retira recursos dos principais produtores de petróleo – Rio de Janeiro, Espírito Santo e São Paulo – em favor dos demais estados e municípios. A proposta, aprovada na Câmara na última quarta-feira (10) por 369 a 72, com duas abstenções, abrange a distribuição dos royalties do petróleo em todo país, incluindo a extração da camada pré-sal.

A emenda prevê que os royalties sejam divididos entre estados e municípios - metade para cada -, seguindo ainda as porcentagens de divisão dos fundos de participação dos estados e dos municípios (FPE e FPM). A receita do Espírito Santo, por exemplo, passaria de pouco mais de R$ 313 milhões, obtida em 2009, para R$ 157 milhões. A do Rio de Janeiro cairia de R$ 4,9 bilhões para R$ 159 milhões.

Ainda que seja por meio de uma PEC, o tributarista Ives Gamdra acredita que a questão terá que ser decidida pelo Supremo porque toca no chamado pacto federativo. “Muitos alegarão que isso fere o pacto federativo. Como no Artigo 60, Parágrafo 4º da Constituição a Federação é intocável, muitos alegarão que haverá um ferimento, uma mácula na Constituição. Haverá um questionamento dos que defendem a impossibilidade de mudança de quaisquer dos fundamentos da atual Federação”, explicou o tributarista.

O ponto de questionamento, para Gandra, será a autonomia financeira dos municípios produtores. O pacto federativo garante a todos os entes federados a chamada tríplice autonomia, ou seja, autonomia política, financeira e administrativa. Os municípios produtores vão alegar que houve uma redução da sua autonomia financeira com a mudança”, aposta.

“Eu, particularmente, entendo que o que a Constituição proíbe é que se elimine o pacto federativo, que se elimina a Federação, e não que ela [a Federação] não possa ganhar perfil diferente de acordo com a própria mudança, com os desafios do século, com as necessidades de readaptação do país a essa economia centralizada, globalizada e, ao mesmo tempo, as reformulações conceituais que representam hoje o conceito de soberania, com formação de blocos regionais”, opinou.

Roberto Mogami

Royalties do Petróleo

No último sábado (20/3/2010) ouvi uma entrevista com o jurista Ives Gandra (amigo de Ibsen Pinheiro) em que o mesmo afirma ser totalmente ilegal essa emenda aprovada recentemente na Câmara dos Deputados. Ele foi enfático nesse ponto e, segundo o próprio, todas as pessoas da sua área com quem discutiu o assunto foram unânimes no mesmo ponto de vista. A emenda é inconstitucional. Portanto, não se trata de ser justa ou injusta, a discussão está num nível acima: se ela é legal ou ilegal. Caso esse problema vá pro STF, a emenda não vai passar. Não sou advogado, portanto acho que outros meios de comunicação (de preferência escritos) deveriam procurá-lo para que ele explicasse a sua opinião, segundo o que está escrito na Constituição.
No blog do jornalista Juca Kfhouri, há vários posts discutindo esse assunto, em virtude da possibilidade de não realização das Olimpíadas. O Rio de Janeiro está sendo massacrado pelas opiniões mais preconceituosas possíveis. A discussão extrapolou os limites do bom senso e o nível de muitos comentários é muito baixo. Estranhamente, meu comentário acerca dessa entrevista - que foi dada na CBN - e o pedido de respeito que exigi em nome dos cariocas não foi publicado (os comentários passam pela autorização ou não do dono do blog). No entanto, neste blog quem manda sou eu e minha esposa, portanto aqui ele é publicado.

Roberto Mogami

domingo, 21 de março de 2010

O Evangelho de Tomé


Eu me lembro bem do início da faculdade de medicina quando o meu sonho era ser um psiquiatra...Por incrível que pareça, gostava de medicina, mas gostava mais ainda de ler sobre Freud, Jung, Reich, Melanie Klein etc. Freud foi quem abriu as portas para um mundo novo a minha frente. Reich expandiu essa concepção de mundo e durante muito tempo foi o pensador que mais me influenciou. Mas, hoje em dia, vejo que Jung foi aquele que mais me marcou, a quem recorro de forma repetida e inconsciente. Ler Jung é estar disposto a também ler sobre uma série de outros assuntos que estão enraizados e permeam toda sua obra. E isso acabou acontecendo comigo, quando durante o curso de medicina, me interessei por aprender medicina chinesa e por extensão a filosofia taoísta, visto que medicina e filosofia na China estão ligadas de forma intrínseca. E dali para o budismo e uma série de outras filosofias de vida e conhecimento de si mesmo.
Hoje, quando leio um livro, vejo um filme, assisto uma peça, vejo ecos do conhecimento de Jung. Na verdade, já tinha deixado de lado essas leituras há um bom tempo, mas meu inconsciente coletivo e a força dos arquétipos que sempre marcaram minha vida sempre acabam encontrado uma maneira de se expressar. Quando criança, adorava freqüentar as aulas de catequese, pois o que mais me atraía eram as histórias do Velho e Novo Testamento. Não tinha maturidade para compreender o sentido daquelas metáforas, mas algo maior que isso mesmerizava o meu ser. Hoje em dia, meu interesse por história e civilizações antigas cumpre esse papel.
Mas, por que motivo eu relato tudo isso para comentar sobre esse livro. Porque ele é avassalador, ele toca muito fundo na alma das pessoas e nos faz refletir imensamente sobre a nossa vivência. E também porque ele é muito Junguiano, psicanalítico e oriental. Ele é um dos textos cristãos gnósticos mais importantes.
Também como conhecido como Evangelho Gnóstico segundo Tomé, Palavras Secretas de Jesus a Tomé ou Quinto Evangelho, ele é composto de 114 Logions, que nada mais são que parábolas. Algumas muito semelhantes ou iguais àquelas encontradas nos Evangelhos canônicos.
Por todo livro, vários temas se repetem:
- a superação da dualidade, corpo-espírito, masculino-feminino etc. Tornar-se Um com o Vivente (Cristo) e o Pai. E para tornar-se Um é necessário tornar-se um consigo mesmo, livrar-se do apego ao ego, às paixões, aos valores essencialmente materiais.
- aceitação das imperfeições, das fraquezas como partes da nossa dimensão humana. Não se preocupar em anulá-las, mas deixá-las serem superadas naturalmente pelas nossa virtudes
- não criar expectativas, viver o aqui e agora (mais psicanalítico, impossível...), reconhecer o mundo como uma passagem, sem preocupações com início e fim
- estar vigilante, isto é consciente dos perigos das paixões, das fraquezas ligadas ao ego, às vaidades e ser forte para rechaçar as mesmas
- encarar a dualidade como uma necessidade, um ponto de passagem para a experiência de ser Único
- Ser Um é transcender, superar as amarras e inclui amar, mesmo aqueles que o perseguem, tiranizam...(confesso que essa é uma dimensão muito alta a ser alcançada)
- Entender que o Reino dos Céus, isto é ser único com o Vivente e o Pai, ou ainda desapegar-se dos conceitos dualistas de objeto e espírito, livrar-se do corpo inanimado, deixar de lado as emoções destrutivas, o ter pelo prazer de possuir etc só se realiza por uma consciência inocente (vide parábola do Reino dos Céus e as crianças ou Adão e Eva)
Enfim, depois de muitos anos, encontrei um livro cristão, e não necessariamente católico, que se exprime de uma maneira muito particular, com uma visão de mundo que é aquela que me fascinava - e continua fascinando - anos atrás.

Roberto Mogami, post de 8 de novembro de 2006